3. cubano, si señor

2 de abril de 2017
Para ler ouvindo:




Sexta-feira é dia de ballet. E como todo dia de ballet, depois da aula, eu estou quase morrendo de cansaço. Por isso, na hora de voltar pra casa, geralmente eu fico bem quietinha, no cantinho e espremida na cadeira do ônibus, lutando contra o sono e tentando não lembrar que no dia seguinte tem de novo (mas eu amo não se enganem). Nesse pacote de introspecção, inclui não olhar para as pessoas.

Mas como eu já disse por aqui e vale a pena repetir: eu adoro andar de ônibus. Esta sexta-feira, em especial, foi importante para me lembrar do por que do amor, já que a rotina ás vezes faz a gente esquecer. Num certo momento da viagem, fui colocar uma blusa de frio com todo o cuidado para não esbarrar na pessoa que estava lado, fazendo um movimento digno de uma contorcionista experiente, sem desviar o olhar da janela e esperando não chamar atenção. Mas falhei! R. me encontrou! E ainda bem. 

- Você é balarina? Fez un movimento aí con os brazos!

Tomei um susto. Olhei para o lado e vi um homem moreno, com cabelos bem cacheados que miravam o céu e, não podia passar despercebida, a característica mais marcante: o sorriso, obviamente - porque quando não é clichê não tem graça. O que dizer do sorriso daquele rapaz? De forma metonímica, ele fez esquecer o meu cansaço. Respondi que era bailarina de ballet clássico, não profissional, e que já dançava fazia uns dois anos. Ele achou incrível.


Ele tinha um sotaque espanhol muito agradável e sutil (e eu estou tentando reproduzi-lo porcamente por aqui), que me deixava curiosa para perguntar de onde vinha. Como eu morei por um tempo com uma espanhola (um beijo pra ti, Araceli), eu sabia que algumas pessoas ficavam ofendidas quando são questionadas de prontidão sobre a sua nacionalidade, principalmente quando tentamos adivinhar de qual lugar ela vem. Assim, resolvi esperar o momento certo.

Ele me contou que dançava salsa e que dançar a dois era uma de suas grandes paixões. “É espirituoso, é vivo!” ele disse, e eu concordei. Comentei que fiz algumas aulas de gafieira e achei muito gostoso.  Depois de acabar o assunto da dança, fomos para o que cada um fazia da vida. Eu disse que fazia Letras e ele, cinema. Não estava na faculdade no caso, ele já trabalhava com isso e gostava muito.

- Aqui en São Paulo é o melhor lugar para se trabayar con isso!

De fato é, eu disse. Conversamos sobre como São Paulo tem uma vida cultural intensa, uma cidade que nunca dorme e como a amamos por isso e por outros motivos. Admiti que eu sou bem caseira e quase não saio, e ele reagiu dizendo que ficar em casa é até bom, mas é preciso lutar contra essa vontade ás vezes e ir conhecer a cidade e tudo o que ela tem para oferecer. Com o repertório de ir para o nordeste, sul e norte do país enquanto eu mal, mal visitei os quatro estados do sudeste, fiquei até um pouco sem graça da minha caseirice. Quando ele me perguntou se eu era de São Paulo, pensei logo que estava ali a minha oportunidade de saber de onde vinha aquele sotaque:

- Eu vin de Cuba.

Eis a surpresa. Tive que me segurar para não fazer mil perguntas, desde  políticas até bastante pessoais:  como veio parar aqui? Por que saiu de lá? Gostava de onde morava? Voltaria a morar? Como são os hospitais? Eu adoro Buena Vista Social Club, viu? Uma força descomunal, diga-se de passagem, mas o bom senso venceu a curiosidade, afinal, ele já devia estar cansado de responder perguntas similares desde que chegou aqui. Me limitei então, a responder um "MUITO LEGAAAAL!!! Nunca conheci alguém de Cuba antes!"

Conversamos por mais algum tempo até nos aproximarmos do ponto que ele descia. Como último recurso, pegamos o nome um do outro para tentar adicionar no facebook. Eu, como sempre, esqueci o sobrenome dele dois minutos depois. Torci, sem esperanças, que ele se lembrasse do meu. "Betini? É italiano?". 

Qual foi minha surpresa quando vi, no dia seguinte, esta mensagem:

"Hola Paloma!!! Lindo ter te conhecido! Espero encontros futuros! Bom final de semana! Besos!"

R. me encontrou de novo! E ainda bem.


        

o primeiro livro de cada uma das minhas vidas

21 de janeiro de 2017
Obs: esse texto foi escrito como um trabalho extra para a faculdade, baseado na crônica de mesmo nome da Clarice Lispector. Por favor, sem comparações, rs.

É preciso um grande dom de autoconhecimento para descobrir quantas e quais vidas você já teve. Eu mesma não o possuo, mas gosto de imaginar que tenho dentro de mim várias: uma vida de leitora, uma vida de filha, uma vida de estudante, uma vida de ser... – e dentro de cada uma delas, há um eterno renascer, como se explodissem novas fontes vitais em todos os momentos de renovação.

A minha estreia como leitora foi o livro “O Pequeno Príncipe”. Li-o com sete anos. Minha mãe nunca foi de ler, mas queria ter uma filha rata de livros – por isso, leu comigo as primeiras páginas para assim me despertar a vontade de continuá-lo, já que eu não tinha lido nada tão longo antes. Lembro-me de acha-lo muito engraçado: imaginar os cabritos mal desenhados pelo narrador me parecia muito divertido, e o ato de olhar para um desenho como uma cobra engolindo um elefante ao invés de um chapéu, curiosíssimo. Até mesmo o contato com a morte pelo tombamento do príncipe não me amedrontou: afinal, ele voltaria para seu planeta e as estrela sorririam para mim dali em diante. Depois dessa primeira vez, o reli diversas vezes, todas elas prontas para sinalizar um novo renascer em qualquer uma das minhas tantas vidas – não só como leitora, mas, principalmente, como um ser em conjunto com o mundo.

O outro primeiro livro da minha vida (que foram os primeiros, na verdade), agora não só como leitora, mas como minha formação de eu, foi a série Harry Potter, assim como todos da minha geração. Ouvi falar pela primeira vez quando a filha de uma amiga da minha mãe, carioca da gema, disse que viu “reurepórter” no cinema. Eu nunca tinha ido ao cinema e muito menos sabia do que se tratava “qualquer coisa repórter”. No começo eu não me interessei: afinal, o que um filme de reportagens poderia me dar? Mas foi só eu olhar a única livraria da minha cidade (que fechou meses depois) que eu o vi tão grande e grosso, quase como uma caixinha de presente com letras brilhantes, parecia um livro que eu leria ao infinito. Não o comprei, peguei emprestado. Harry Potter foi então o primeiro livro que abriu portas para tantos outros, e, principalmente, foi a primeira coisa que eu gostei por mim mesma (excetuando, talvez, vulcões e dinossauros).

Depois, me aventurei por diversos clássicos da literatura: David Copperfield, Dom Casmurro, Lolita, Anna Karenina... Todos eles de extrema importância para a minha renovação como leitora. Mas o último que eu gostaria de falar é “O Apanhador no Campo de Centeio” de J.D Salinger. Ele apareceu para mim num período de transição importante, entre o limite da adolescência e vida adulta (pelo menos o mais próximo de vida adulta que já tive) no qual passei por momentos de profunda depressão. O livro me fez refletir sobre os outros e sobre mim, como eu lido com o meu eu, como eu encaro a minha sensibilidade. Foi com ele que dei um passo definitivo, abrindo portas para a minha nova vida de ser.

Ainda espero por um livro que poderei dizer “esse livro sou eu!” num modo bem clariciano de dizer. Mas é provável que essa espera nunca se complete, uma vez que me parece, cada vez mais, que esse “eu” é composto por todas as minhas vidas, que se renovam de forma infinita (ainda bem!) e que só alcançará um equilíbrio quando tudo acabar em ossos.


Talvez, dizer que “esse livro sou eu agora” seja bem mais preciso.          

sobre mudança de casa, nova identidade, aspirações e felicidade

19 de janeiro de 2017
Desde quando li Harry Potter pela primeira vez, eu quis ser da Grifinória. Além do motivo óbvio dos meus personagens preferidos estarem na casa, eu realmente achava o lema "coragem e nobreza" o mais bonito de todos - ainda acho, inclusive. Ficava sonhando com o dia em que o chapéu seletor iria me colocar na casa vermelha e dourada (!), eu conheceria os marotos (!!) e seria tão inteligente quanto a Hermione (!!!). Tamanha foi a minha surpresa quando, no primeiro teste que fiz para saber qual casa eu pertenço, ele deu Corvinal. No primeiro, no segundo, no terceiro... até mesmo no Pottermore.

Não achava Corvinal ruim,  o pior era que, no fundo, eu sabia perfeitamente que eu tinha tudo a ver com a casa. Apesar de querer muito, sempre soube que não era corajosa o bastante (nem nobre) para estar com os grifinorianos - mas.a.vontade.não.passava! Pouco a pouco fui me acostumando com a ideia, sempre com uma pontinha de tristeza, mas com um certo orgulho crescente e um forte sentimento de pertencimento.


Até que, nesse início de 2017, as meninas que moram comigo resolveram  fazer o teste, o que me deu uma vontadezinha de voltar pro Pottermore. Descobri que o site passou por uma transformação e que eu poderia ou recuperar o meu usuário antigo, ou refazer a seleção das casas. Fui na segunda opção, pois estava curiosa, mas eu meio que já esperava qual seria o resultado, então fiz sem muitas expectativas. Quase pulei da cadeira quando o final do teste disse que eu era Grifinória. Eu realmente não entendi. Passei por uma crise existencial (!). Não aceitei. Já estava acostumada com a minha vidinha corviniana (?).




Depois de um dia ou dois, após o choque da mudança, comecei a refletir sobre os motivos que poderiam ter levado o resultado mudar  (levo a cultura pop realmente a sério mesmo, e você que é feio?). E o fato é que nesses dois anos morando em São Paulo, numa cidade tão assutadoramente maravilhosa, vibrante, desconhecida e selvagem, vi que é impossível passar por alto e eu não me transformar nem um pouquinho. Dois mil e dezesseis, principalmente, um ano extremamente especial em diversos aspectos, me desafiou de muitas maneiras conseguindo despertar uma coragem que eu não sabia que existia em mim. Estou longe de lutar contra Voldemort, mas estou conseguindo lidar com as minhas mini lutas diárias.

O ano passado começou com a minha decisão de mudar de curso, definitivamente. Antes eu estava fazendo História e não me identifiquei logo no primeiro semestre, mas fui empurrando por medo de enfrentar mais um vestibular, por medo de perder um ano, por medo de me achar velha demais (!). Até que depois de alguns sinais, percebi que a situação se tornaria insustentável e eu nunca seria feliz estando no curso em que eu estava. E, para finalizar, uma certeza cristalina crescia me mostrando que a minha verdadeira vocação era fazer Letras. Conversei com professores, alunos e amigos, e decidi migrar para o novo curso de forma não oficial, mas que me trouxe a maior felicidade do mundo: fazer aquilo que ama.

Isso me fez quebrar um bloqueio que estava me cercando há muito tempo. Comecei a me abrir e permitir um espaço para conhecer novas pessoas e fazer amizades, coisa que não tinha feito pois estava muito concentrada em mim, o que fazia eu me sentir extremamente solitária e infeliz. Voltei a me sentir empolgada, com vontade de explorar e viver. Consegui sair de uma república horrível, onde os meus momentos de ficar em casa (que eu tanto prezo) eram um verdadeiro inferno, e fui parar num lugar tão bom, mas tão bom, que chamar de lar chega ser pouco.


Acho que não é coincidência que eu tenha me apaixonado também. Uma consequência esperada. Complicada, se você for pensar que eu estava num relacionamento a distância há quase dois anos. E aí veio a segunda coisa mais corajosa que tive de fazer ano passado, que me causou mais dor do que qualquer outra: dizer adeus a quem ainda se ama, mas que era preciso dizer adeus. Chorei muito e ainda choro, mas permanecemos somos amigos e isso faz toda a diferença. Agora estou solteira (mas sozinha nunca (rs!!)), embarcada em algo tão incerto feito a vida, mas que me traz muitas alegrias e me desperta tantas coisas...




Foi em dois mil e dezesseis que eu realmente comecei a construir uma vida no lugar que eu escolhi viver. Eu já amava São Paulo de forma idealizada e  externa, mesmo morando nela, mas a partir desse ano que eu comecei a me sentir parte de seu microcosmo, de suas manias, de suas gírias e tepes, no seu ritmo e na vontade de gritar o quanto eu a amo. Consegui voltar a ser feliz, algo que, durante um período de extrema desilusão, cheguei a pensar que jamais seria de novo (dramático? talvez...).

Eu ainda sinto que a minha casa é Corvinal (não só pelos anos, mas porque é mesmo), porém essa mudança de resultado foi importante para eu perceber que estou me tornando uma pessoa que eu sempre quis ser. Lutas diárias são importantes. Mudar e, ao mesmo tempo, recuperar a si mesma, é extremamente delicioso. Ser selecionada para uma nova casa foi só simbólico.






Mais coisas legais que aconteceram em 2016:

- Comecei a ponta no ballet;
- Conheci o Kio, o Truta e a Sardinha <3 (E o Edgar, meu gato capixaba, apareceu no começo de 2016 também *_*)
- Participei de uma greve e ocupação de um prédio (da Letras, no caso);
- Apresentei minha iniciação científica no Sintusp;
- Fiz uma festa de aniversário e ganhei um bolo baseado em Harry Potter da minha querida amiga, Aline Porfirio;
- Voltei a ser usuária assídua de karaokês;
- Chorei vendo Animais Fantásticos e Onde Habitam;
- Tive as melhores aulas da minha vida;
- Minha autoestima melhorou 50%;
- A vida é bela.



Resoluções para 2017:

Eu sei que um novo ano, na prática, não muda nada, mas querendo ou não é o nosso ciclo que se reinicia, então é uma boa oportunidade de tentar mudar alguma coisa. Quero fazer metas bem atingíveis, vamos ver se consigo:

1. Me alimentar melhor;
2. Me alongar três vezes por semana;
3. Usar menos o celular;
4. Fazer uma limpa no facebook;
5. Fazer um trabalho comunitário;
6. Juntar dinheirinho pra uma viagem no fim do ano;

7. Ser mais organizada.



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